A Associação Brasileira de Antropologia (ABA), junto com a sua Comissão de Assuntos Indígenas (CAI) e a Articulação Brasileira de Indígenas Antropologes (ABIA) vêm por meio desta nota manifestar sua indignação com a decisão do governo Bolsonaro de não concluir o Censo Demográfico 2022 na Terra Indígena Yanomami (TIY). Mais de 50% da população yanomami pode ficar de fora do recenciamento realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O atual governo federal está tratando de esconder o quê da sociedade com esta negativa?
A não realização do levantamento programado para o conjunto da TIY significa deixar de dimensionar os efeitos da COVID-19 na população Yanomami e Ye’kwana, de avaliar as ações de proteção e de atenção à saúde e à vida prestadas pelo governo à população indígena e, principalmente, de ignorar os efeitos da ocupação garimpeira da Terra Indígena. Estima-se que a atividade de extração de ouro, cassiterita, terras raras e outros minerais no interior da TIY mobiliza um contingente que hoje está estimado em mais de 40 mil pessoas. Além disso sabe-se que há uma logística estruturada que conecta grupos garimpeiros em regiões de difícil acesso no interior da floresta com os principais centros, no país e no exterior, de comércio legal e ilegal destes minerais. Lembramos que o extrativismo minerários em Terras Indígenas é uma atividade ilegal e inconstitucional.
As comunidades não alcançadas pelas equipes de recenseadores são acessadas somente por helicóptero. Vivem em regiões montanhosas, em uma geografia que, no entanto, não tem impedido a chegada de epidemias, como as ocorridas nos anos 1970 durante a construção da Rodovia Perimetral Norte (BR-210), e a primeira grande invasão garimpeira do território indígena na segunda metade dos anos 1980. Estima-se que, na primeira invasão, cerca de 10% da população Yanomami foi levada a óbito.
Assim, a ABA junto à CAI e à ABIA solicitam publicamente que a direção do IBGE reveja a sua decisão, e que sejam disponibilizados os recursos necessários à realização do trabalho dos recenseadores na Terra Indígena Yanomami. Solicitamos também que o Ministério Público Federal (MPF), o Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), a Comissão Nacional de Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas da OAB se mobilize e intervenha, impedindo que se prolongue a omissão culposa com os efeitos genocidas por parte do Estado nacional.
Os dados gerados pelo Censo 2022 são essenciais para que a sociedade brasileira tenha consciência da situação real das comunidades indígenas; tenha condições de formular uma estratégia de retirada do garimpo ilegal da TIY e de elaboração de um Plano Emergencial para a atenção da saúde da população Yanomami e Ye’kwana.
Brasília, 07 de dezembro de 2022.
Associação Brasileira de Antropologia – ABA
Comissão de Assuntos Indígenas – CAI/ABA
Articulação Brasileira de Indígenas Antropologes – ABIA
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