A Associação Brasileira de Antropologia (ABA), com sua Comissão de Assuntos Indígenas (CAI), vem a público manifestar a sua grande preocupação com a situação de extrema violência na Terra Indígena Serrinha, no Rio Grande do Sul. Esta semana nos chegou pelas mídias e por testemunhos de indígenas da região, notícias sobre uma escalada de ameaças de morte, que ao que consta culminou com os assassinatos de pelo menos três indígenas até este domingo, dia 17 de outubro.
Divulgou-se amplamente nas mídias sociais desesperados pedidos de socorro dos indígenas, muitos deles acompanhados de relatos sobre ameaças de morte, sem que nenhuma ação oficial tenha sido encaminhada para lhes assegurar a proteção necessária pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI), Ministério Público Federal (MPF) e/ou Polícia Federal (PF), apesar da situação de conflito já ser de amplo conhecimento de todas as instituições. E o que inicialmente eram ameaças materializou-se em mortes e um contexto de violências que dificilmente se estancará se não houver ações imediatas dos poderes públicos.
O pano de fundo destes conflitos se assenta em uma realidade permeada por ilegalidades em relação aos arrendamentos de terras indígenas para a produção extensiva de grãos, que se iniciou com o Serviço de Proteção aos Índios (SPI), foi referendada pela FUNAI, e tem se intensificado com as políticas e ações do atual governo federal, para entregar as terras indígenas ao agronegócio. Esses arrendamentos realizados ilegalmente com empresários do agronegócio têm causado alta concentração de terra nas mãos de poucas famílias, alto grau de contaminação pelos insumos agrotóxicos, desmatamentos, comprometimento da autosustentação alimentar de parcelas da população, além de sucessivos conflitos entres os núcleos domésticos Kaingang, especialmente com aqueles núcleos que não aceitam e discordam dos arrendamentos.
A ABA e sua Comissão de Assuntos Indígenas solicitam dos órgãos competentes, Fundação Nacional do Índio (FUNAI), Ministério Público Federal (MPF) e Política Federal (PF) que: (a) as instituições do Estado estejam presentes para garantir a segurança física e social dos indígenas na região; e (b) todas as ações ilegais sejam apuradas e os crimes esclarecidos com urgência. A Comissão Nacional de Direitos Humanos (CNDH), que visite o local para apurar as responsabilidades dos órgãos do Estado em todo o processo.
Esperamos que a situação de ilegalidade atual seja estancada, de tal modo que os próprios Kaingang possam encontrar as suas formas próprias de resolução de conflitos. Solicitamos que o assédio e a violência constante bem como as pressões externas ameaçadoras e ilegais de particulares interessados nos arrendamentos não possam mais se manter a partir das garantias a serem oferecidas pelas instituições do Estado.
Brasília, 18 de outubro de 2021.
Associação Brasileira de Antropologia – ABA e sua Comissão de Assuntos Indígenas – CAI
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