A Associação Brasileira de Antropologia (ABA), em consonância com a sua Comissão de Assuntos Indígenas, vem se somar às análises e denúncias realizadas pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) e pela Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO) a respeito dos sinais emitidos pelo Ministério da Saúde, no tocante ao atendimento à saúde dos povos indígenas, endossando-as.
A intenção de reduzir tal atendimento ao status de um departamento na atenção primária à saúde apresenta o sério risco de desmantelar toda a complexidade e o refinamento de um subsistema do Sistema Único de Saúde (SUS) desenvolvido ao longo de 20 anos.
Lembramos que o Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SASISUS) foi instituído pela “Lei Arouca” (Lei nº 9.836/1999). Ele foi implementado inicialmente pela Fundação Nacional de Saúde (FUNASA) e, em seguida, pela atual Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI), e está estruturado com base no conceito de “distritos sanitários”. Hoje temos 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas organizados e em funcionamento. Por fim, em 2002, por meio da Portaria MS nº 254, deu-se início à implementação da Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas (PNASPI), com 9 diretrizes orientadoras para o Subsistema.
Ao longo desta experiência de 2 décadas, equipes médicas foram adquirindo suas especificidades de atendimento a povos cultural, linguística e etnicamente diferenciados, com a constante participação e o monitoramento colaborativo por parte destes mesmos povos e de suas organizações indígenas, nos contextos locais e nas instâncias de participação e controle social do SASISUS. Há também que se salientar a complexidade infraestrutural deste subsistema, com toda uma engenharia de transporte e de saneamento básico, este último, em muitos casos, sendo crucial para garantir, por exemplo, acesso à agua potável de qualidade em contextos com altos índices de poluição ambiental.
Entendemos que há problemas, inclusive de má gestão de ações e recursos em alguns DSEI. Problemas que necessitam ser enfrentados e investigados de maneira urgente. As discussões havidas nas etapas locais e distritais da 6ª Conferência Nacional de Saúde Indígena, que será realizada em Brasília de 27 a 31 de maio de 2019, trazem muitos e importantes subsídios ao aprimoramento do Subsistema.
Banalizar toda a experiência adquirida na construção do SASISUS, reduzindo-o a mero atendimento primário de saúde, sem considerar a sua história, os motivos da sua complexidade, bem como as suas peculiaridades e as demandas de uma atenção à saúde diferenciada no SUS em níveis de atenção de média e alta complexidade, representaria um claro retrocesso no reconhecimento da diversidade e na aplicação dos direitos Constitucionais garantidos aos povos originários no país.
Por tais razões, assim como a APIB e a ABRASCO, a ABA não pode deixar de repudiar medidas político-administrativas que não promovam a consolidação e o desenvolvimento do SASISUS, e que provoquem danos à saúde individual e coletiva da população indígena no Brasil.
Brasília, 28 de março de 2019.
Associação Brasileira de Antropologia – ABA e sua Comissão de Assuntos Indígenas – CAI
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