A Associação Brasileira de Antropologia (ABA), por meio de seu Comitê Povos Tradicionais, Meio Ambiente e Grandes Projetos, e de sua Comissão de Assuntos Indígenas, vem expressar veemente repúdio quanto às ações do Congresso Nacional que buscam atacar os direitos de povos indígenas e desmantelar políticas ambientais. A aprovação das MPs 1.154/23 e 1.150/22, assim como a votação em caráter de urgência do PL 490/22 na Câmara dos Deputados, no dia 24 de maio, representam um grave retrocesso para a democracia brasileira. A colocação em votação do PL 490/22 afronta a vontade da maioria, que elegeu um programa de governo baseado em compromissos ambientais diante das mudanças climáticas e na efetivação dos direitos indígenas, agendas igualmente imbricadas à política internacional do país.
Manifestamos nossa profunda indignação diante de ações que colocam em risco o meio ambiente, os povos indígenas e a própria democracia. A insistência na continuidade de uma agenda antiambiental e anti-indígena causa perplexidade diante da crise humanitária e das evidências de genocídio contra os povos Yanomami e Guarani-Kaiowá. Tal agenda demonstra um desprezo pelas contribuições científicas sobre questões ambientais e indígenas no Brasil. Não faltam, de fato, contribuições, expressas em uma ampla gama de notas e pareceres técnicos divulgados por associações e entidades científicas sobre temas como: Marco Temporal, Licenciamento Ambiental, Conservação da Mata Atlântica, Mineração em Terras Indígenas e Áreas Protegidas, entre outros.
Especificamente no que tange à proposta de alteração na forma de demarcação das Terras Indígenas, previstas no PL 490, esta traduz-se, na prática, em uma abertura para a exploração econômica predatória dos territórios étnicos, especialmente aqueles situados no cerrado e na região amazônica, onde se encontram algumas das principais bacias hidrográficas do planeta. Caso essas medidas sejam aprovadas, juntamente com as que afetam as estruturas administrativas do Estado brasileiro, o país acabará por intensificar a promoção da discriminação racial e étnica, contrariando a Constituição Federal de 1988 e as convenções e acordos internacionais dos quais é signatário, como a Convenção 169 da OIT.
Diante do exposto, torna-se evidente a escalada de uma crise civilizatória promovida por instituições que, em nome de uma economia extrativa, de raízes coloniais, seguem promovendo ataques continuados à proteção de nossos recursos ambientais, e desrespeitando direitos constitucionais fundamentais.
A ABA reafirma publicamente seu compromisso em defender os direitos indígenas e a luta pelo meio ambiente em prol das gerações atuais e futuras, o conhecimento científico, a justiça social e climática, assim como os princípios constitucionais e democráticos de nosso país.
Brasília, 26 de maio de 2023.
Associação Brasileira de Antropologia – ABA, seu Comitê Povos Tradicionais, Meio Ambiente e Grandes Projetos e sua Comissão de Assuntos Indígenas
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