A Associação Brasileira de Antropologia (ABA), por meio da sua Comissão de Laicidade e Democracia, vem se manifestar publicamente sobre episódios recentes envolvendo a exposição Festa, Baia, Gira, Cura, que vem ocorrendo no Museu da Cultura Cearense, parte do complexo do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, sediado na cidade de Fortaleza, Ceará. Essa exposição é resultado do trabalho do fotógrafo Jean dos Anjos, antropólogo associado da ABA, com curadoria de Marília Oliveira e Rafael Escócio. A exposição materializa aspectos do universo religioso e cultural afro-cearense por meio de imagens, textos e objetos relacionados ao terreiro de Umbanda e Candomblé Cabana do Preto Velho da Mata Escura / IléÀṣẹOjúỌya, que possui 40 anos de existência e está situado em Fortaleza[1].
A mencionada exposição vem sofrendo ataques de diferentes setores sociais, tanto da sociedade civil quanto de representantes do Poder Legislativo Estadual, que ferem princípios democráticos e constitucionais ao acionar argumentos essencialmente pautados no racismo religioso contra os grupos de matrizes africanas e afro-brasileiras em suas variadas expressões (Lei 14.532, de 2023).
Torna-se também imprescindível apelar à garantia da autonomia da gestão dos espaços museológicos públicos para a organização de suas exposições em suas dependências. A mencionada exposição, que é resultado de cerca de 20 anos de pesquisas no campo da antropologia, com destaque para a antropologia da imagem, além de ocorrer em duas salas reservadas, também ocupa espaços de passagem nas dependências do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, como rampas de acesso, murais e passarelas, fato comum a diversas outras exposições de temáticas variadas ocorridas nos últimos anos. Nesse sentido, a ABA endossa as palavras do Centro Cultural, em nota sobre os recentes episódios, ao se manifestar contra argumentos infundados, “à medida que se baseiam em uma compreensão superficial sobre a atuação de espaços museológicos e no desconhecimento da memória do centro cultural, além de denotar um preconceito velado e a intolerância com práticas culturais dissidentes[2].”
Por fim, a ABA se manifesta em defesa do livre exercício da prática antropológica que se dedica a articular os universos da pesquisa, da arte e da cultura, como é o caso da exposição Festa, Baia, Gira, Cura,e de outras que ocorrem nas diferentes regiões brasileiras.
Brasília, 08 de novembro de 2023.
Associação Brasileira de Antropologia – ABA e sua Comissão Laicidade e Democracia
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[1] Ver os fatos noticiados em https://g1.globo.com/ce/ceara/noticia/2023/10/20/artista-defende-exposicao-sobre-terreiros-de-candomble-e-umbanda-chamada-de-entidades-esdruxulas-por-deputada-cearense.ghtml acesso 06 de Nov. de 2023.