Manifesto contra o PL 1.584/2025 que cria o “Código Brasileiro de Inclusão”

O Comitê Deficiência e Acessibilidade da Associação Brasileira de Antropologia (ABA) e o Grupo de Trabalho Filosofia DEF da Associação Nacional de Pós-Graduação em Filosofia (ANPOF), juntamente com o Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) e os coletivos Parada do Orgulho PcD, Quilombo PcD, Coletivo Feminista Helen Keller, Coletivo Comédia Sentada de Artistas Def, Instituto Caue, Instituto Vidas Negras com Deficiência Importam (VNDI),  Associação Brasileira para Ação por Direitos das Pessoas Autistas (ABRAÇA), Associação dos Deficientes Visuais do Estado do Rio de Janeiro (ADVERJ), Movimento Brasileiro de Mulheres Cegas e com Baixa Visão (MBMC) e Urece Esporte e Cultura (URECE) manifestam sua profunda preocupação diante da proposta de Projeto de Lei nº 1.584/2025, apresentada pelo Deputado Federal Duarte Junior (PSB), visando uma suposta consolidação da legislação voltada a esse segmento da população brasileira, na forma de um “Código Brasileiro de Inclusão”.

Apesar da retórica de diálogo e escuta adotada pelo parlamentar, o projeto já tramita em regime de urgência, o que contraria os princípios de ampla construção coletiva, participação social efetiva e transparência. A urgência imposta compromete o tempo necessário para o devido debate com os movimentos sociais de pessoas com deficiência, que são plurais, diversos e nem sempre consensuais em muitas pautas, além de especialistas na área jurídica e com a própria sociedade civil organizada.

É fundamental destacar que o Brasil já possui um arcabouço legal robusto e ampla e internacionalmente reconhecido no campo dos direitos das pessoas com deficiência, a começar com a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que tem status constitucional, e a leis como a Lei n.º 13.146/205, conhecida como Lei Brasileira de Inclusão (LBI). O desafio central, portanto, não é compilar normas em qualquer PL com esse tipo de finalidade, como no PL n.º 1.584/2025, mas, sim, garantir a efetiva implementação e regulamentação da LBI em todo o território brasileiro.

A proposta de “linguagem simples” para unificar os textos legais, embora revestida de boas intenções, esconde riscos técnicos relevantes. A alteração da linguagem jurídica em diversos dispositivos pode modificar o sentido e a interpretação de direitos consolidados, abrindo brechas para retrocessos, a exemplo da supressão, pela parte conservadora do Parlamento brasileiro, da palavra ‘gênero’ em diversas leis, PLs ou dispositivos legais. A linguagem é também norma — e qualquer alteração simbólica precisa ser amplamente debatida, sob pena de fragilizar conquistas históricas.

Além disso, a proposta surge em um momento político extremamente delicado, com crescimento de pautas conservadoras, com ampla ofensiva a direitos de grupos sociais vulnerabilizados. Tentar aprovar um projeto de tal magnitude a curto prazo e sem ampla escuta, representa um risco elevado e grave, principalmente em termos de instrumentalização política indevida da pauta da deficiência, bastante reforçada por uma lógica assistencialista e pessoalista, como se os direitos conquistados fossem concessões de figuras públicas, e não resultado de uma longa luta histórica e coletiva dos movimentos das pessoas com deficiência.

Diante de tais considerações, e com base no compromisso com os princípios da participação social, da legalidade e da não regressividade dos direitos humanos, é legítimo e necessário defender o arquivamento imediato do referido projeto de lei. Os movimentos de pessoas com deficiência não devem ser tutelados e precisam de respeito à sua História e protagonismo, assim como investimento legislativo-jurídico na concretização dos direitos já assegurados em lei, a exemplo da regulamentação de vários artigos ou dispositivos da própria LBI.

Brasília, 12 de maio de 2025.

Comitê Deficiência e Acessibilidade da Associação Brasileira de Antropologia (ABA); Grupo de Trabalho Filosofia DEF da Associação Nacional de Pós-Graduação em Filosofia (ANPOF); Conselho Federal de Serviço Social (CFESS); Coletivos Parada do Orgulho PcD; Quilombo PcD; Coletivo Feminista Helen Keller; Coletivo Comédia Sentada de Artistas Def; Instituto Caue; Instituto Vidas Negras com Deficiência Importam (VNDI); Associação Brasileira para Ação por Direitos das Pessoas Autistas (ABRAÇA); Associação dos Deficientes Visuais do Estado do Rio de Janeiro (ADVERJ); Movimento Brasileiro de Mulheres Cegas e com Baixa Visão (MBMC); Urece Esporte e Cultura (URECE)

Leia aqui a nota em PDF.

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