A Associação Brasileira de Antropologia (ABA) e sua Comissão de Assuntos Indígenas vem a público externar a sua preocupação com a decisão monocrática do ministro do STF, André Mendonça, determinando a “SUSPENSÃO DOS EFEITOS DO PROCESSO ADMINISTRATIVO FUNAI Nº 08620.001538/2011-15; DA PORTARIA MJ Nº 793, DE 2007, E DO DECRETO Nº 12.289, DE 2024, EM RELAÇÃO À TERRA INDÍGENA TOLDO IMBU, ATÉ O FINAL DO JULGAMENTO DE MÉRITO DO TEMA Nº 1.031 DO EMENTÁRIO DA REPERCUSSÃO GERAL”.
A decisão do ministro responde à Ação movida pelo Estado de Santa Catarina, pelo município Abelardo Luz e por indústrias agropecuárias da região, sob a alegação de que a demarcação da TI contraria a ordem do ministro Fachin, que teria suspendido todos os processos relacionados ao marco temporal das terras indígenas (RE nº 1.017.365-RG/SC, Rel. Min. Edson Fachin, j. 07/05/2020, p. 08/05/2020). Assim, de uma só vez, ocorreu a suspensão do processo administrativo demarcatório da Terra Indígena Toldo Imbu, bem como da homologação promovida pela Funai, em dezembro do ano passado, até o julgamento final do Tema 1031 do STF e o julgamento dos Embargos de Divergência no processo.
Vale observar que essa determinação do ministro Mendonça ocorre depois de o STF ter declarado inconstitucional a tese do marco temporal, em 21 de setembro de 2023. A decisão do ministro, em caráter liminar, apoia-se no argumento da proteção à ‘segurança jurídica” mas não considera a insegurança física, econômica e social que, inevitavelmente, ela acarretará aos indígenas da Terra Indígena Toldo Imbu, uma poulação de 730 indígenas Kaingang estabelecidos em uma área de 1.960 hectares. Como bem observou a ministra Sônia Guajajara, os frequentes questionamentos jurídicos sobre as terras indígenas têm contribuído para ”o atraso histórico na devolução das terras de ocupação tradicional indígena”.
A referida Terra Indígena – demarcada pelo SPI pela primeira vez em 18/06/1902, depois identificada e delimitada em 15/10/2001 e com Portaria Declaratória emitida pelo Ministério da Justiça, vigente a partir de 20/04/2007 – compõe o conjunto de treze Terras Indígenas homologadas pelo presidente Lula desde que assumiu o seu terceiro mandato, em janeiro de 2023. Essas homologações, ainda que lentamente, buscam superar a paralisia em que se encontravam os processos demarcatórios das terras indígenas, em face da determinação do governo Bolsonaro de não as demarcar. Por mais de 4 anos, é também fundamental lembrar, os povos indígenas não tiveram nenhuma de suas terras demarcadas, apesar de quatorze de seus processos estarem concluídos desde 2013, com todas as etapas finalizadas.
Para que os direitos territoriais indígenas sejam respeitados e restabelecidos, urge que o Plenário do STF proceda ao julgamento final do recurso extraordinário (Tema 1.031 da repercussão geral) em que a Corte declarou inconstitucional a tese do marco temporal das terras indígenas.
Esta é a expectativa da Associação Brasileira de Antropologia (ABA) e, seguramente, dos povos indígenas no Brasil que estão vivendo sob a permanente ameaça dos impactos causados por uma medida claramente inconstitucional, e que visa tão somente atingir-lhes no que eles têm de mais precioso, as suas terras originárias.
Brasília, 30 de janeiro de 2025.
Associação Brasileira de Antropologia (ABA) e sua Comissão de Assuntos Indígenas (CAI)
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