A Associação Brasileira de Antropologia (ABA), em nome da comunidade brasileira de antropólogos e antropólogas, está de luto. O Museu Nacional em chamas deixou a comunidade antropológica chocada e, na primeira hora, entre emudecida pela tristeza e mobilizada pela indignação. Mas o que cabe a nós falar? Mais uma nota que cairá no vazio dos últimos governos diante do descaso face a precariedade das condições materiais do Museu Nacional? Face ao descaso dos últimos anos com a cultura, a ciência e a pesquisa?
A Antropologia perde um acervo único da diversidade cultural dos povos indígenas, conseguido através de pesquisas etnográficas e etnológicas. Acervo irrecuperável. Nada sobrou da coleção etnológica e nada sobrou do espaço de trabalho e ensino de antropologia.
O Brasil perde espaço histórico e vivo de produção de cultura, de ciência e da memória histórica brasileira. Coleções de antropologia, paleontologia, arqueologia, botânica, zoologia, mineralogia e da história de tempos coloniais e imperiais foram destruídas. Perdem-se não só acervos como objetos de pesquisa de professores e estudantes. Projetos interrompidos.
A Antropologia perde um importante espaço de trabalho, espaço de vida, de encontros entre professores e estudantes, de laboratórios de pesquisa e de seus acervos de pesquisa. O primeiro programa de pós-graduação de antropologia social, segundo a nova legislação da pós-graduação brasileira, foi criado em 1968 e se deu no Museu Nacional, hoje reconhecido como da qualidade máxima pela CAPES. Pode ser recomposto em outro espaço, mas não será o mesmo lugar de vivência entre pesquisadores pois muitos de seus dados de pesquisa estão já apagados, destruídos.
A ABA, sua diretoria e seu Conselho Diretor, em nome de todos os associados e em nome de toda a comunidade antropológica manifesta solidariedade a todos os colegas, professores, estudantes, pesquisadores e servidores do Museu Nacional. Junto com eles, no que ainda seja possível, e sabemos que é muito pouco, lutaremos pela recuperação e divulgação dos registros de suas coleções e pesquisas e da recuperação do que resta do patrimônio arquitetônico: apenas parte de sua estrutura.
Protestamos contra décadas de descaso governamental, e apontamos a queda deliberada nos últimos anos de recursos federais passados para as Universidades Públicas Federais que resultaram inclusive na queda de recursos destinados à manutenção do Museu Nacional. Dos R$ 520.000,00 anuais previstos desde 2014 para a manutenção do Museu, passou-se para os cerca de R$ 340.000,00 em 2017 e R$ 54.000,00 em 2018. Os projetos de reforma e revitalização requeridos há tanto tempo, não se efetivaram a tempo.
Os cortes nos últimos anos às políticas de ciência e tecnologia e políticas de educação e cultura transformaram-se em cortes aos direitos culturais à preservação da memória do Brasil e à produção de ciência.
A política do atual governo, ao cortar gastos, contribuiu drasticamente para diminuir os recursos necessários à ciência, à tecnologia, à cultura e à educação atingindo irrecuperavelmente a preservação da memória nacional simbolizada pelo Museu Nacional e atingindo um dos primeiros centros de produção de pesquisas e de cultura em que a Antropologia participa de forma indiscutível.
A Associação Brasileira de Antropologia está de luto.
Lia Zanotta Machado
Presidente da ABA (Gestão 2017/2018)
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Museu Nacional em chamas. Antropologia em luto. Por Lia Zanotta Machado
Confira o artigo da Presidente da ABA: http://catarinas.info/museu-nacional-em-chamas-antropologia-em-luto/.
Correio Braziliense divulga a manifestação da Presidente da ABA sobre a maior tragédia cultural da América Latina: o Museu Nacional em chamas
Confira aqui as declarações da Profª Lia Zanotta Machado / Presidente da ABA e do Prof. Luiz Fernando Dias Duarte / ex Vice-presidente da ABA e atual Diretor Adjunto do Museu Nacional.