A Associação Brasileira de Antropologia (ABA), junto com sua Comissão de Assuntos Indígenas (CAI), vem por meio desta nota expressar sua grande preocupação com ameaças à própria vida relatadas por lideranças indígenas guarani-mbya e guarani-nhandeva da Terra Indígena Tekoa Dje’y/Rio Pequeno, no município de Paraty, no Rio de Janeiro. Segundo estas lideranças, a comunidade indígena se encontra em uma evidente situação de vulnerabilidade física, ocasionada por conflitos com não-indígenas na disputa por terra. Por tal razão, no mês de junho deste ano uma comitiva de representantes desta comunidade esteve em Brasília buscando a abertura de um canal de diálogo junto ao Ministério Público Federal (MPF) e, principalmente, à Presidência da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), para denunciar a situação conflituosa em que se encontra.
Ocorre que a história dessa Terra Indígena (TI) é marcada por conflitos há décadas, mas segundo relatos dos Guarani mais velhos, apesar da tensão sempre presente, durante vários anos a situação permaneceu relativamente estável até que, em 2007, a comunidade solicitou à FUNAI sua regularização definitiva. Assim, em fevereiro daquele ano a FUNAI, atendendo à demanda guarani, publicou uma portaria que instituiu o início da atuação do grupo técnico de identificação da TI. Desde então, informam os indígenas, as pressões e ameaças aumentaram vertiginosamente, sendo que somente 10 anos depois, em 2017, a FUNAI publicaria no DOU o relatório circunstanciado de identificação e delimitação da Terra Indígena, com superfície de 2.370 hectares. Segundo os relatos, meses depois da publicação do relatório, um indígena da comunidade foi assassinado. No ano de 2020 o Ministério Público Federal ajuizou Ação Civil Pública requerendo o reconhecimento da mora da FUNAI e da União acerca do processo de demarcação da TI, bem como que a Justiça Federal determine a finalização da demarcação. Na última semana de junho, deste ano, chegou à CAI-ABA a denúncia de ameaça de morte da liderança Guarani Neusa Kunhã Tekoa Dje’y, de 31 anos de idade. Ela coordenou o encontro de mulheres indígenas na sua aldeia, nos dias 4 a 6 de junho de 2021, que culminou com a colocação de uma placa que simbolizava a presença indígena na região e a reivindicação pelo reconhecimento da Terra Indígena. Três dias depois, ainda segundo os relatos dos Guarani, a placa desapareceu e, mais recentemente, dois homens armados com facões invadiram a aldeia, um deles fugindo e o outro sendo preso pela Polícia Militar, e Neusa passando a ser fortemente ameaçada na região.
Estas dinâmicas relatadas pelos indígenas, apresentam uma muito preocupante escalada de tensões e manifestações de violência, razão pela qual a Associação Brasileira de Antropologia vem aqui se manifestar, solicitando que os órgãos competentes, em particular modo o Ministério da Justiça, o MPF e sua 6ª Câmara de Coordenação e Revisão, acompanhem o caso sobre o processo de demarcação e, sobretudo, com a máxima urgência, lancem mão de todos os mecanismos legais de proteção aos membros da comunidade Guarani aqui em foco.
Brasília, 12 de julho de 2021.
Associação Brasileira de Antropologia – ABA e sua Comissão de Assuntos Indígenas – CAI
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