Os conflitos no Quilombo de Santa Rosa dos Pretos em Itapecuru-Mirim (MA) agravaram-se desde o início de 2021, em razão das obras de duplicação da BR-135, também pelas invasões e comercializações clandestinas de áreas de terras dentro do território quilombola. Referimo-nos às Fazendas Raio de Sol e Meu Xodó, cujas áreas já estão em processo de desapropriação pelo INCRA através do Decreto de Desapropriação n. 14.203/2015 que declarou como de interesse social o Território Quilombola de Santa Rosa dos Pretos. Recentemente, essas áreas de terra foram repassadas a um grupo agropecuário do Maranhão que as registrou no Cartório de 1ª Oficio Extrajudicial de Itapecuru-Mirim (MA) ignorando o decreto de desapropriação do INCRA e aproveitando-se da morosidade atual do INCRA.
A morosidade do processo de regularização fundiária e o aparente desmonte do INCRA ameaçam os direitos territoriais resguardados pela Constituição Federal de 1988 e se soma ao contexto da pandemia, agravando ainda mais a situação de vulnerabilidade das comunidades quilombolas. Em Santa Rosa dos Pretos fomos informados que está em curso ações de ameaça e tentativas de criminalização de lideranças quilombolas. Desde abril de 2021, Anacleta Pires, Joercio Pires e Elias Pires vem sendo intimados a comparecer à Delegacia de Polícia Civil de Itapecuru-Mirim, sem qualquer acusação formal. Em maio deste ano, as lideranças foram surpreendidas por mais uma intimidação referente a um Boletim de Ocorrência onde são acusadas de proferir ameaças dirigidas ao comprador das fazendas já atribuídas ao Quilombo pelo decreto acima mencionado. Apesar do comparecimento à Delegacia as lideranças quilombolas estão sendo objeto de um novo procedimento, a saber, a instauração de um Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) Nº 0801264-84.2021.8.10.0048, em tramitação na 3ª Vara de Itapecuru-Mirim, que as requerem uma vez mais sem qualquer acusação formalizada.
Em 2020, o Comitê Quilombos da ABA se pronunciou por meio de uma nota com vistas a alertar os poderes públicos sobre a mesma situação, agora agravada. As lideranças quilombolas já tinham denunciado aos órgãos públicos estaduais e federais inúmeras violações a seus direitos, motivando o ajuizamento de, ao menos, quatro Ações Civis Públicas por parte do MPF e DPU. Chamamos atenção para a não realização junto às comunidades quilombolas de consulta prévia, livre e informada conforme preconiza a Convenção 169 da OIT sobre a duplicação da BR-135 que tem causado um profundo impacto nas condições de vida da comunidade quilombola. Ainda em 2020 essas situações relacionadas às violações em curso foram objeto de denúncia internacional junto à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).
Diante do exposto a ABA manifesta-se contra os atos de judicialização e de criminalização das lideranças quilombolas e dá o seu apoio à defesa dos seus direitos ameaçados.
A ABA insta o INCRA que dê continuidade à ação demarcatória cuja estagnação tem propiciado um acirramento dos conflitos por intermédio de invasões e comercializações ilegais das terras do Quilombo Santa Rosa dos Pretos;
A ABA demanda às autoridades locais de segurança pública e do judiciário que atuem no sentido de impedir comportamentos de caráter ilegal e/ou criminoso que coloquem em risco a comunidade do Quilombo Santa Rosa dos Pretos.
Pelo exposto, consideramos necessário que as autoridades concernidas atentem para a gravidade da situação e considerem a urgência de respostas às demandas relativas aos direitos ameaçados das comunidades do Quilombo Santa Rosa dos Pretos.
Brasília, 11 de junho de 2021.
Associação Brasileira de Antropologia – ABA e seu Comitê Quilombos
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