O Comitê Migrações e Deslocamentos da Associação Brasileira de Antropologia vem se juntar às notas de apoio assinadas pela Associação Colombiana de Antropologia, pela Escola de Estudos de Gênero da Universidade Nacional da Colômbia e por diversos departamentos de antropologia do país vizinho, que enfatizam a necessidade de que o governo colombiano atenda o chamado ao diálogo realizado pela Minga Nacional pela Vida e evite o uso da força e a criminalização do movimento indígena como resposta ao direito constitucional à mobilização e ao protesto social.
As comunidades indígenas do sudoeste colombiano definem a Minga como uma prática cultural e ancestral, que se baseia no trabalho coletivo em benefício das comunidades, no direito próprio e na cosmovisão dos povos. Desde os anos 1990 a Minga tem sido uma importante e impactante forma pacífica de protesto que defende o bem-estar dos povos, não apenas nos territórios das comunidades indígenas dos departamentos de Cauca, Nariño, Huila e Valle del Cauca, mas também nos territórios do mundo que vêm sendo afetados atualmente por práticas extrativistas predatórias.
No dia 10 de março do presente ano iniciou a Minga Indígena e Camponesa do Sudoeste pela Defesa da Vida, o Território, a Democracia, a Justiça e a Paz, que se transformou na Minga Nacional pela Vida; incluindo atualmente, e de modo amplo, a setores e coletivos populares, afrodescendentes, camponeses, estudantis e ambientalistas em diferentes departamentos do país.
A ABA considera legítimas as demandas da Minga que exigem a presença do presidente numa mesa de diálogo, respostas diante do descumprimento dos acordos assinados com governos anteriores (até mesmo no Acordo de Paz assinado em Havana), a defesa e reconhecimento dos direitos ancestrais ao território, medidas efetivas de proteção para os líderes sociais e territoriais, assim como a discussão do Plano Nacional de Desenvolvimento que coloca em risco a importante figura da Consulta Prévia e desconhece os acordos alcançados no marco da Mesa Permanente de Concertação em 2018.
Vale a pena lembrar que a maioria das lideranças sociais assassinadas na Colômbia nos últimos anos são integrantes de comunidades étnicas e que a região sudoeste do vizinho país tem sido uma das mais impactadas pelas diversas formas de violência. Além do assassinato sistemático de lideranças sociais, também os massacres e os deslocamentos forçados massivos afetam intensamente às populações indígenas, afrodescendentes e camponesas. O alto número de deslocados internos dessa região e de refugiados no Equador é apenas uma das expressões dessa grave situação.
Manifestamos nossa preocupação com as expressões racistas que estimulam visões coloniais sobre os indígenas que estão sendo apresentados como bárbaros ou selvagens. Essa imagem, reproduzida pela grande mídia e pelas redes sociais, impossibilita o diálogo nacional, incita à violência civil e desqualifica as demandas das populações indígenas. Ao mesmo tempo, essas informações e imagens contribuem para a estigmatização e criminalização das populações que protestam sob amparo da Constituição Nacional e das normativas internacionais de Direitos Humanos e que exigem modelos de sociedade que sejam coerentes com o Buen Vivir.
Brasília, 08 de abril de 2019.
Associação Brasileira de Antropologia – ABA e seu Comitê de Migrações e Deslocamentos
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