Vimos a público manifestar nossa consternação e indignação, somando-nos à Sociedade Brasileira pelo Progresso da Ciência (SBPC) e ao Instituto de Estudos de Gênero (IEG), com a aplicação de critérios excludentes, marcadamente não acadêmicos e não científicos nos atuais editais de bolsas de pós-graduação (mestrado, doutorado e pós-doutorado) da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Santa Catarina (FAPESC) (Editais 18, 19 e 20/2024).
À revelia das seleções e indicações de projetos feitas pelos programas de pós graduação de várias áreas do conhecimento de instituições universitárias em Santa Catarina, a agência de fomento negou financiamento sob alegações diversas, destacando a de que não haveria “correlação direta entre o tema proposto pelos projetos e o desenvolvimento regional do Estado de Santa Catarina, de modo a possibilitar o alcance pleno dos objetivos do certame”, como manifestado pelas notas produzidas e difundidas pela a SBPC: SBPC manifesta preocupação ante critérios não acadêmicos adotados pela Fapesc e pelo IEG: Nota de Repúdio.
Ao Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social (PPGAS/UFSC) não foi diferente. Ao serem indicados projetos de doutorado que versavam sobre temas como violência contra povos indígenas no Mato Grosso do Sul e encarceramento de pessoas trans e travestis em Florianópolis, Santa Catarina, o PPGAS/UFSC foi instado a apresentar documento com “justificativa da pertinência dos projetos para as demandas do ecossistema de C&T de Santa Catarina” e posteriormente ambos foram recusados por “não cumprir critérios técnicos dos editais”. Projetos com temas sobre turismo LGBT em Florianópolis, Santa Catarina e sociabilidade de pessoas bissexuais, mesmo cumprindo os critérios técnicos exigidos nos referidos editais, foram rejeitados sob a justificativa de que “não vislumbram correlação direta entre os temas propostos pelos projetos e o desenvolvimento regional do Estado de Santa Catarina, de modo a possibilitar o alcance pleno dos objetivos do certame”, visto que o escopo do edital seria “o desenvolvimento do ecossistema catarinense de Ciência, Tecnologia e Inovação (CTI), contribuindo para a solução de problemas da sociedade catarinense e brasileira, atendendo especificamente às necessidades do poder público, do setor produtivo e da comunidade local”.
Manifestamos, desse modo, nossa consternação e indignação diante da aplicação de critérios que, ao contrário do argumentado, prejudicam o desenvolvimento e a inovação científica ao limitarem as possibilidades e condições de acesso a recursos públicos para desenvolvimento de pesquisas que trarão contribuição para o enfrentamento de questões que afetam a sociedade brasileira e catarinense, promovendo desenvolvimento humano, social e democrático. Reiteramos que tal rejeição impossibilita o livre exercício da pesquisa acadêmico científica, atacando princípios constitucionais de não discriminação, prejudicando de modo potencial a produção de conhecimento antropológico, em particular, e do ecossistema científico estadual e nacional, em geral.
Brasília, 11 de outubro de 2024.
Associação Brasileira de Antropologia – ABA, sua Comissão de Direitos Humanos e seu Comitê de Gênero e Sexualidade
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