Recomendações para o Plano de Operacionalização de Vacinação contra a COVID 19 nas Comunidades Quilombolas

Desde o início da implementação do Plano Nacional de Vacinação, em março do ano de 2021, o  Comitê Quilombo da Associação Brasileira de Antropologia (ABA) tem recebido notificações de  pesquisadores e lideranças quilombolas com relatos sobre problemas referidos à execução do Plano de  Vacinação Quilombola.

Ressaltamos que a ABA, em março de 2020, publicou a “Nota Pública pela imediata inclusão dos quilombolas no Plano de Vacinação Covid 19,” na qual informamos as autoridades sobre a grave situação em  que se encontravam as famílias quilombolas. Essas tiveram sua segurança alimentar e sanitária afetadas pela  expansão da Covid o que gerou óbitos nas comunidades bem como empobrecimento dos seus meios de  subsistência e de alimentação. O referido documento enfatizou os direitos dessas famílias garantidos pela  Constituição Federal do Brasil de 1988 e conquistados através de Convenções Internacionais a exemplo da  Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Outros documentos também chamaram  atenção sobre o agravamento das condições de vida das comunidades quilombolas (Política Nacional de  Saúde Integral da População Negra, em 2009; Política Nacional de Saúde Integral das Populações do Campo  e da Floresta, instituída pela Portaria nº 2.866/2011, do Ministério da Saúde).

Ao longo dos meses de março, abril e maio do ano de 2021 os integrantes do Comitê Quilombo têm  recebido vários documentos que relatam a grave situação em que se encontram os quilombolas, com o  aumento de mortes e agravamento dos problemas resultantes da falta de vacinação. Tais manifestações são  oriundas de várias comunidades quilombolas, citadas a seguir: Mangueiras, Caldeirão, Deus me Ajude,  Bairro Alto, Bacabal e Pau Furado, que pertencem ao município de Salvaterra, localizado na Ilha do Marajó,

quilombolas do município de Moju e ainda, comunidades quilombolas de Barcarena, no Estado do Pará;  comunidade quilombola de Monte Alegre, no município de São Luís Gonzaga, Maranhão; comunidades de  Vão Grande, Vãozinho e Bocaiana, no município de Porto Estrela, Mato Grosso.

Além dessas, outras comunidades também se manifestaram advertindo sobre a ausência e a falta de  acesso de profissionais de saúde devido aos conflitos cada vez mais acirrados em seus territórios, como no  caso de Rio dos Macacos, município de Simões Filho – BA. Os relatos apontam um número insuficiente de  vacinas; o aumento do número de mortes; casos frequentes de recusa de vacinar quilombolas que residem nas  cidades (uma resultante do agravamento de conflitos em suas terras).

A extrema degradação das condições de vida dessas comunidades nos levam a solicitar com a máxima  urgência uma atenção dos gestores públicos no sentido de cumprir os dispositivos legais que protegem os  direitos dessas comunidades. É preciso fazer valer o Decreto 4887, de novembro de 2003, que determina o  reconhecimento da autodeclaração dos quilombolas, como parte da política de assistência que agora se faz  absolutamente necessária.

O presente documento recomenda aos órgãos envolvidos na operacionalização do Plano de  Operacionalização da Vacinação contra a COVID-19 nas comunidades quilombolas as seguintes  providências:

Associação Brasileira de Antropologia, Caixa Postal 04491, Brasília-DF, CEP: 70842-970 Tel/Fax: (61) 3307-3754 – E-mail: aba@abant.org.br – Site: www.portal.abant.org.br

a) A imediata aplicação da Vacinação nas comunidades quilombolas como grupo prioritário, conforme  determinada na ADPF- 742, já definidos no Plano Nacional de Vacinação contra a Covid-19;  b) A adequação do um Plano de Operacionalização de Vacinação considerando o que determina a  Convenção 169 da OIT, a partir do diálogo com os representantes das comunidades quilombolas sobre a  aplicação de procedimentos compatíveis com os modos de vida, tais como a construção de calendários  apropriados às realidades das comunidades;

c) Tomar como referência para o Plano de Vacinação os dados fornecidos pelos cadastros das associações  comunitárias e, na ausência destes, as listagens fornecidas por seus representantes. Esse trabalho resultará  em informações de maior amplitude e mais qualificadas para ampliar a cobertura de imunização nos  territórios quilombolas;

d) Considerar os dados disponibilizados nos sites oficiais da Fundação Cultural Palmares (FCP) e INCRA e  necessária revisão da relação de comunidades quilombolas fornecida no Quadro 2 – da N.IM n. 41/2021  – CGPNI/DEIDT/SVS/MS, para cálculo das disponibilização das doses fornecidas;

e) Considerar as territorialidades quilombolas na campanha de vacinação sem excluir as comunidades que  se autodefinam como quilombolas, independentemente do reconhecimento oficial já obtido do governo  brasileiro;

f) Realizar imediatamente campanhas educativas de esclarecimentos sobre a vacinação, sobre a importância  da imunização, da continuidade do uso de máscaras, e sobre os cuidados necessários pós-vacinação para a  redução dos riscos de adoecer, principalmente para os mais jovens, os maiores afetados neste novo  contexto pandêmico;

g) Estabelecer e manter os planos de combate ao Covid -9, com a promoção de condições para ações de  isolamento, quarentena, para requisições de equipamentos diante da precariedade do sistema de saúde na  maioria dos territórios quilombolas já que esses não contam com postos de saúde 24 horas e nem com  agentes de saúde. O que é da máxima relevância para enfrentar os casos em que o vírus da Covid-19 pode  ser confundido com o de uma gripe comum, podendo levar à óbito.

h) A formação de equipes de saúde preparadas para atuar nas comunidades quilombolas, prioritariamente  agentes de saúde da própria comunidade, para receber, higienizar e distribuir os alimentos e kits de  produtos de higiene, assim como colaborar no monitoramento dos casos, nos moldes que vem sendo  realizado pela SESAI para os indígenas;

i) A criação de um sistema de monitoramento dos casos com estudos periódicos para avaliar o estado da  pandemia nas comunidades;

j) Criação de estratégias de segurança quanto ao acesso à vacinação in loco, quando necessário, haja vista:  a) o agravamento da violência em locais mais distantes dos centros urbanos; b) a impossibilidade de  muitas pessoas não disporem de condições, principalmente de saúde, para o deslocamento até os postos  de vacinação.

A ABA se posiciona em favor dos preceitos constitucionais e da legislação internacional e vem por  meio desse documento recomendar às autoridades públicas esses procedimentos para assegurar  minimamente o pleno cumprimento da garantia dos direitos das famílias fortemente atingidas na situação  atual.

Brasília, 20 de maio de 2021.

Associação Brasileira de Antropologia – ABA e seu Comitê Quilombos

Leia aqui a nota em PDF.

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