ASSASSINATO E REPETIÇÃO DE VIOLAÇÕES CONTRA O POVO YANOMAMI

A ABA, por intermédio do seu Comitê de Assuntos Indígenas (CAI), vem por meio dessa nota solicitar medidas urgentes contra o ataque criminoso e mortífero sobre um grupo de indígenas yanomami.

Na última sexta-feira, dia 11, recebemos a notícia de um ataque a tiros contra um grupo de indígenas yanomami, na capital de Roraima, Boa Vista. Esse ataque produziu os assassinatos de uma mulher, que estava com seu filho ainda bebê, e um homem. Os assassinos fugiram, a pé!

Não é a primeira vez que um grupo de descendentes dos sobreviventes do massacre dos anos 70, passem temporadas na cidade de Boa Vista onde ocorreu mais esse crime. Os anos 70, para este grupo, tem um significado devastador: quase 80% do grupo foi dizimado uma epidemia de gripe e de sarampo que chegou com a construção da rodovia  Perimetral norte. As obras de sua construção destruíram não somente vidas, atingiram também a própria capacidade do grupo de se reproduzir socialmente. O seu impacto chega até os dias atuais.

A presença deste grupo na capital do estado de Roraima, que conta proporcionalmente com a maior população indígena no Brasil, cerca de 11%, segundo os dados do censo de 2010, não é nova. No entanto tem aumentado nos últimos anos com a invasão garimpeira por todos os lados da TIY.  Alguns lugares são atingidos pela ocupação literal de parte de seus territórios, outros sofrem por verem suas regiões se transformarem em rotas para invasões. Para alguns, sair de seus territórios pode ser um ato de desespero diante da destruição que se propaga. As autoridades do município, do estado e da federação pouco fizeram para buscar uma alternativa de acolhimento diferenciado aos indígenas que chegam à capital. Pouca informação sobre o histórico desses sobreviventes aparece na sociedade local. Circulam nas redes denúncias sobre alcoolismo, desnutrição infantil e pouco atendimento a essas pessoas vulnerabilizadas. A precariedade em que vivem contribui para alimentar a indiferença social e práticas racistas contra esse grupo e os povos indígenas de modo geral.

Ocorreu mais um crime que, diferente de outros, se deu à vista de todos, na capital do estado. Chama atenção também o seu lugar: aconteceu na conhecida Feira do Produtor, lugar público de sociabilidade local.

Infelizmente não foi um primeiro e único ataque a população indígena na capital do Estado. No ano de 2017, em Mecejana (bairro central, na capital de Roraima), uma discente universitária indígena, dormindo na rede, na varanda de uma casa, foi atingida por uma bomba caseira, que causou queimaduras nela e no seu filho, um bebê.  A mesma cena se repete hoje, dessa vez com o assassinato de uma mãe indígena yanomami e outras pessoas feridas por arma de fogo.

A ABA vem a público afirmar a responsabilidade do Estado sobre essas ocorrências criminosas, associadas por sua vez, a outras, como as invasões dos territórios indígenas. O Estado não cumpriu até hoje as medidas de reparação relativas à construção rodovia BR-210, a Perimetral Norte, que resulta no agravamento da situação de vida dos indígenas contribuindo para a intensificação das ameaças que recaem sobre eles na capital do Estado.

É urgente responsabilizar os autores deste crime hediondo, no estado de Roraima. Urge que as autoridades do município, do Estado e os organismos federais atuem para combater o racismo contra os povos indígenas e providenciem as medidas de reparação que lhes são devidas. Somente assim se poderá garantir que crimes como esses não se repetirão, particularmente em relação a esse grupo que se desloca periodicamente entre as cidades de Caracaraí e Boa Vista. Com efeito, esses crimes mais recentes são reveladores das incontáveis violações que o povo Yanomami e Ye’kuana têm sofrido há mais de 4 anos em seus territórios.

A ABA se solidariza com o povo Yanomami e solicita todos os esforços do MJ, MPF, Polícia Federal e o CNDH para elucidar o crime e dar prosseguimento às medidas de proteção e de reparação cada vez mais necessárias.

Brasília, 17 de novembro de 2022.

Associação Brasileira de Antropologia – ABA e sua Comissão de Assuntos Indígenas – CAI

Leia aqui a nota em PDF.

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