A Associação Brasileira de Antropologia, através de sua Comissão de Assuntos Indígenas, da sua Comissão de Direitos Humanos e de seu Comitê de Migrações e Deslocamentos, vem a público externar sua preocupação sobre a situação de abrigamento das famílias da etnia Warao no DF, diante das informações graves trazidas pelo documento da Defensoria Pública Federal e da Defensoria Pública do DF. Em visita realizada no dia 08 de novembro os defensores:
“verificaram as péssimas condições de acolhimento do local. O abrigo que deveria suportar no máximo 80 pessoas, conta com pelo menos 188 indígenas, dentre mulheres, crianças e pessoas idosas. No momento da visita, uma equipe de saúde formada por duas enfermeiras estava no local realizando protocolos de testagem para tuberculose. Naquele abrigo, foram diagnosticados casos de tuberculose. Uma criança de 5 anos faleceu com suspeita da doença e outras pessoas estão internadas em hospitais do Distrito Federal. Verificou-se ainda diversas crianças com aparentes sintomas gripais, como coriza, espirros e tosse.”
A perda da criança trouxe sofrimento e preocupação na comunidade Warao de Coromoto. A falta de comunicação dos gestores do abrigo com as lideranças indígenas e os órgãos competentes de resguardo dos direitos indígenas – neste caso, Fundação Nacional do Índio e Secretaria Especial de Saúde Indígena – tem prejudicado ações de acompanhamento e atenção adequada à saúde. Fato que tem promovido a responsabilização das mães e das famílias indígenas pelo adoecimento e perda de seus filhos, quando estamos detectando omissão e inação das instituições e órgãos públicos envolvidos
Além da situação descrita no DF, foi publicada em 13 de novembro, em diversos veículos informativos, a notícia sobre a existência de um projeto para transferir os habitantes indígenas (das etnias Warao, Eñepa e Karina) dos abrigos Pintolândia, Nova Canaã e Tancredo Neves para o abrigo Rondon 3, que comporta mais de 1500 pessoas, não indígenas. As lideranças indígenas temem que a unificação dos abrigos aumente a situação de precarização e descaso e protestaram essa semana em Boa Vista.
Acompanhando a situação dos indígenas refugiados em diferentes estados da federação, temos observado que muitas decisões têm sido tomadas sem discussão ou consulta prévia junto aos indígenas, gerando insegurança e desconfiança entre eles. É importante registrar que o Estado tem conhecimento da presença de povos indígenas no fluxo migratório venezuelano há pelo menos 5 anos. Entretanto não há até hoje uma política consistente e adequada de abrigamento e permanência em condições dignas para essa população no território nacional, sendo que essa situação de precariedade tem marcado as condições de abrigamento no país. As políticas de acesso à saúde também são precárias, estando os Warao excluídos do subsistema de saúde indígena do SUS por serem migrantes e, por isso, considerados não aldeados. Encontram-se, portanto, impossibilitados de recebimento de atenção em saúde de acordo com os pressupostos de cuidado intercultural, entre outras particularidades próprias das populações indígenas.
Diante deste quadro desolador solicitamos a atenção direta do MPF, através da sua 6ª Câmara para o acompanhamento destas denúncias, lembrando que em muitos estados o MPF e a DPU atuam sobre o tema. A ABA e suas comissões de Assuntos Indígenas e Direitos Humanos e seu comitê de Migrações e deslocamentos se colocam à disposição para colaborar na busca de saídas viáveis e de acordo com as normas de direitos nacionais e internacionais para os povos indígenas em contextos de migração e refúgio.
Brasília, 17 de novembro de 2021.
Associação Brasileira de Antropologia – ABA; sua Comissão de Assuntos Indígenas – CAI; sua Comissão de Direitos Humanos – CDH; e seu Comitê Migrações e Deslocamentos
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